Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

terça-feira, 10 de julho de 2007

1176. Carta ao primeiro-ministro

Pelo extremo interesse de que se reveste e sem comentários, por desnecessários para avaliação de lisura de procedimentos transcrevo abaixo uma carta hoje enviada ao primeiro-ministro pelo professor jubilado do Instituto Superior Técnico com os anexos que acompanharam a referida carta.

* * *

10 de Julho de 2007

Caro José Sócrates,

Li nos jornais de ontem ("Meia hora" e outros) que disse que: "No nosso ponto de vista [ penso que do Governo] a manutenção da Portela é inviável" e que "já estudámos isso". Estas afirmações chegaram-me algo isoladas.

O LNEC está, neste momento, a estudar as duas possíveis localizações do NAL (novo aeroporto de Lisboa) em Alcochete e na Ota.

Se o NAL vier a ser em Alcochete, poderá ser construído de um modo faseado e ter uma expansão quase ilimitada. Construída uma primeira fase (uma pista e algo mais) todos os nossos problemas aeronáuticos imediatos da região de Lisboa ficam resolvidos. Quando começarmos a pensar na construção da 2ª fase (talvez daqui a 10 ou 15 anos) teremos de decidir se o novo aeroporto se deve expandir de modo a substituir completamente o da Portela, ou se devemos adoptar em definitivo o modelo dos dois aeroportos: Portela + Alcochete.

É uma decisão que dependerá de factores difíceis de avaliar agora, nomeadamente, evolução do tráfego aéreo, problemas de som e segurança, qualidade dos transportes na região de Lisboa, influência sobre o Turismo, etc.. A questão não pode, assim, de modo nenhum, ser considerada já estudada.

Se o NAL for na Ota, terá de ser construido de uma só vez e depois de construído não se poderá expandir. Se fecharmos a Portela no momento em que estiver pronto, pouco depois, teremos o muito grave e dificil de resolver problema de só termos na região de Lisboa um único aeroporto saturado e sem possibilidades de expansão.

Não temos, felizmente, de tomar uma decisão imediata sobre o fecho ou manutenção da Portela. Esperemos algum tempo, pelo menos até conhecermos a localização do NAL e o calendário da sua construção, para discutirmos o assunto com calma e tomarmos uma decisão que possa ser acertada e consensual.

Envio-lhe a seguir os resumos de duas curtas intervenções que fiz, no passado dia 6, num encontro promovido em Leiria pela JS sobre o aeroporto da Ota. ("A Ota, solução ou problema")

Vou enviar estes textos para a "Acção Socialista" pois considero da maior importância que estes problemas e este tipo de informação sejam divulgados e discutidos no interior do PS.

Com as minhas melhores saudações socialistas

António Brotas

* * *

1ª Intervenção

O governo criou em 1998 a NAER com o encargo de estudar e assegurar a construção do NAL (novo aeroporto de Lisboa) impondo-lhe desde logo a localização na Ota, ou no Rio Frio.

A NAER abriu um concurso para escolher um consultor tendo sido escolhido os Aeroports de Paris (ADP).

Os ADP indicaram três implantações possiveis para o NAL (duas no Rio Frio e uma na Ota) e fizeram uma listagem de estudos parciais EPIAs (Estudos Preliminares de Impacto Ambiental) que teriam de ser feitos.

Foi escolhido um conjunto de especialistas coordenados pelo Professor Fernando Santana, da Universidade Nova de Lisboa, para elaborarem estes EPIAs. Depois de 1999 estes EPIAs não foram continuados nem actualizados .

Tenho aqui o resumo do EPIA relativo à OTA.

Com base neste documento e nalgumas informações adicionais vou indicar 7 questões que desconselham fortemente hipótese da Ota:

  1. A localização do NAL na Ota permite a construção só de duas pistas que nunca poderão ser aumentadas . O espaço para estacionamento de aeronaves é também muito limitado. Se for construido o aeroporto na Ota o país necessitará dentro de uns 30 anos de um novo aeroporto que não se vê como poderá ser construido. Entretanto, o nosso desenvolvimento aeronautico será atrofiado porque a Ota não poderá servir para um hub internacional de cruzamento de grandes rotas internacionais.
  2. A construção do NAL na Ota obriga a uma movimentação de cerca de 60 a 70 milhões de metros cúbicos de rochas e terras (cerca de 1/5 do volume da Muralha da China).
  3. A construção do NAL na Ota obriga a desviar ou canalizar a Ribeira do Alvarinho e a dar bastante atenção a outras duas. Em qualquer caso, se for feito o aeroporto da Ota, será, com a excepção de algumas grandes barragens, a maior construção da Europa e talvez do Mundo em leito de cheia .
  4. Houve uma lacuna nos estudos de 1999. Não não parece ter sido notado que, além dos problemas referidos nos itens anteriores, era necessário consolidar os terrenos argilosos do leito das ribeiras. Fui alertado para este problema pelo Professor Diogo Pinto responsável pela construção do aeroporto de Macau. A NAER só se terá dele apercebido em 2003. Encomendou então um estudo à empresa Parsons. No relatório elaborado por esta empresa recentemente divulgado (há poucos meses) é indicado que a consolidação dos terrenos (numa profundidada da ordem dos 25 metros) deverá ser feita por meio de 250 mil estacas de brita com 90 cm de diâmetro e com um comprimento total de 3.000 km. Que eu saiba, ainda não foi feita por engenheiros portugueses uma apreciação cuidada e crítica deste trabalho, mas há especialistas portugueses com experiência deste tipo de trabalhos que pensam que outros processos de consolidação poderão ser preferiveis.
  5. Do ponto de vista puramente aeronautico, um aeroporto na Ota tem inconvenientes que o desconselham e para os quais vários pilotos e oficiais oficiais da Força Aérea têm procurado chamar a atenção.
  6. Um aeroporto na Ota tem dificeis acessos ferroviários e rodoviários que estão ainda muito longe de estar estudados.
  7. Um aeroporto na Ota tem um impacto ambiental muito negativo. Em particular, a sua construção destroi uma área significativa de uma zona húmida que, em todo o território, corresponde a 1 % do território nacional.

A meu ver, estas questões deviam ter excluido liminarmente o aeroporto da Ota. Em vez disso, a hipótese da Ota foi escolhida depois de excluido o Rio Frio com argumentos, que nunca foram seriamente avaliados [e um deles, o do choque com aves, baseado em estudos risiveis como poderei provar] . Na sequência, a NAER, não foi capaz de apresentar um único argumento sério em favor da Ota e, sistematicamente, procurou ignorar as opiniões de técnicos e outros intervenientes que tinham opiniões críticas contrárias aos seus propósitos. Acho que foi um erro.

O problema ficou quase parado porque os estudos feitos com vista à construção do aeroporto da Ota só mostraram a dificuldade desta construção. De facto, todos os estudos com vista à construção do Aeroporto da Ota estão hoje atrasadíssimos. Felizmente que, com o aparecimento da Internet, dos emails, dos blogues e com alguma ajuda da Comunicação Social, os críticos puderam falar directamente para o País que compreendeu que o assunto lhe dizia respeito.

Foi assim que o problema da Ota se transformou num problema nacional.

Surgiu a alternativa de Alcochete e o LNEC vai agora apreciar as duas hipóteses tendo, necessariamente, de aprofundar e se pronunciar sobre as questões atrás referidas e outras mais. É fundamental que o seu parecer e o relatório finais sejam considerados convincentes pelo País e, em especial, pelos que olham o problema com o saber e o sentir de engenheiros. É a condição essencial para chegarmos a um consenso nacional, que é possivel mas que já tarda, sobre esta matéria.

Penso que, sobretudo nas questões relacionadas com o ponto 5 atrás citado, o LNEC deve estar atendo e ouvir as opiniões dos intervenientes que já se pronunciaram sobre o assunto.


2ª Intervenção

Não esqueço que estou estou numa cidade e numa região particularmente interessadas em conhecer o impacto local que poderá a localização do NAL.

Para abordar o assunto há que relacionar a localização do NAL com o planeamento da rede ferroviária pois os dois assuntos estão intimamente ligados. É este assunto que me parece mais importante abordar aqui.

Começo por fazer um apelo à Comunicação Social. Evitem falar em TGVs e falem em linhas de bitola europeia. O nosso problema ferroviário é o de construir uma rede ferroviária que permita aos nossos comboios, sobretudo de mercadorias, entrarem em Espanha, quando a Espanha mudar a bitola das suas linhas para a bitola europeia, o que está a fazer aceleradamente. Se o não fizermos, daqui a 15 ou 20 anos os nossos comboios de mrercadorias não poderão sair do país. Se o fizermos, poderão até à Polónia. Teremos de ter em funcionamento, durante um largo periodo (mais de duas décadas) duas redes com duas bitolas. Mas as novas de bitola europeia não serão todas linhas TGV, no sentido de permitirem a passagem de comboios TGV. Umas serão e outras não. Mas mesmo nas linhas TGV circularão comboios que não são TGV.

Neste momento, o que vos proponho é um exercício. Admitam, como hipótese, que o aeroporto da Ota vai ser construido a que, daqui a 15 anos, estão concluidas as linhas TGV de Lisboa para o Porto com passagem pela Ota, e de Lisboa a Badajoz, com as entradas em Lisboa que têm anunciadas (ponte para o Barreiro e entrada a Norte de Lisboa).

Qual será o trajecto ferroviário das mercadorias do Centro para a Europa? Poderão descer a Lisboa, atravessar o Tejo, passar por Badajoz, Madrid e Valladolid., ou subir ao Porto e passar por Vigo e por cima de Bragança. Está adiada, neste momento, para calendas gregas, a linha fundamental para o desenvolvimento do Centro, a linha com 200 km de Aveiro a Vilar Formoso, que não tem obviamente de ser uma linha TGV, mas tem de ser de bitola europeia.

...


10 comentários:

Ruvasa disse...

Amigo Ruben

É pena que os nossos governantes e em especial o PM em exercício, não
estejam abertos à re-criação critica de acordo com as novas perspectivas que a marcha da humanidade vai rasgando.

Aceitar o diálogo e toda a frutuosa colaboração dos cidadãos, é um
receituário que, sinceramente, pode contribuir para o progresso do País.

Discutir os pontos de desacordo é meio caminho andado para precaver equívocos.

Bom será, pois, que nos habituemos ao convívio da responsabilidade cívica, ouvindo os pontos de vista dos outros e aceitando que nos digam o que nos desagrada. Só assim se conseguirá construir uma sociedade livre e igual.

Um abraço
AAlves

Ruvasa disse...

Viva, Alves!

Bom seria, na verdade. O pior é que eles não pensam do mes mo modo.

Abraço

Ruben

Agnelo Figueiredo disse...

Olá Ruben

Veja na minha página o que pensa o Arquitecto sobre isto.
(e o que pensa o Costa, ou melhor, o que diz que pensa)

Vladimir disse...

Nada melhor que a crítica, para que se possam alcançar conclusões que beneficiem o colectivo e não apenas os interesses pessoais...

E para si, o que é a tolerância? Acha que vivemos num país tolerante?

Anónimo disse...

...vai lá espreitar a notícia que o Agnelo publicou no blog sobre este assunto...



Beijinho!

Ruvasa disse...

Viva, Vladimir!

De acordo. Aliás, já lhe dei no seu blog a minha opinião.

Abraço

Ruben

Ruvasa disse...

Viva, Agnelo

Já lá estive a ver. Neste mundo - português - ainda haverá algo que nos surpreenda?

Abraço

Ruben

Ruvasa disse...

Viva, MJoão!

Já fui e comentei.

A "desvergonha" é evidente.

Beijinho

Ruben

Anónimo disse...

Olha para esta pouca vergonha:

«O LNEC ainda não sabe se vale ou não a pena estudar Alcochete...já escreveu duas cartas ao Ministério da Defesa perguntando se o espaço está efectivamente disponível e ainda não recebeu resposta.
Passa hoje um mês sobre o dia em que o ministro Mário Lino atribuiu ao laboratório a incumbência de fazer um estudo comparativo Ota-Alcochete. No despacho governamental o LNEC tem seis meses (portanto, até 12 de Dezembro) para o fazer.
O que significa que um sexto do tempo já passou»!!!

http://dn.sapo.pt/2007/07/12/ nac..._sobre_aer.html

...


BEijinho

Ruvasa disse...

Viva, MJoão!

Em Portugal a vergonha, a honra a dignidade estão definitivamente perdidas.

Beijinhos

Ruben