Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

2820. As férias suplementares

De como a situação chegou ao que chegou em Portugal. Um exemplo.

Está lançada a polémica quanto à eliminação dos três dias de férias suplementares, por, digamos, bom comportamento.

Recuemos um pouco e relembremos a história.

Tudo começou quando um pateta qualquer num governo de idiotas se lembrou de “premiar” os funcionários públicos com mais de, salvo erro, 55 anos de idade, com um dia de férias suplementar, ou seja, em vez de ficar com o direito a gozar 22 dias de férias por ano, gozaria 23. Quem tivesse mais de 60, gozaria 24. O “prémio” seria de 25 para quem tivesse mais de 62 anos.

O prémio só seria atribuído a quem, além daqueles requisitos, fosse assíduo ao local de trabalho, isto é, não faltasse ou faltasse pouco.

Só o enunciado é já ridículo. Quem não tenha faltas ou falte pouco!!! Ninguém jamais soube qual era a previsão do “faltar pouco”. Um dia por ano, por mês, por semana, por dia?!…

Repare-se que o prémio é devido só por “estar” no emprego. Não por “trabalhar”; menos ainda por produzir!

Desde logo, se levantou a questão de saber por que carga de água os maiores de 55 anos tinham tal direito e os restantes não. Ou há Moral ou comem todos. Assim é que é.

Então, salvo erro em finais de 2004 ou inícios de 2005, a bagunçada foi estendida a todo o pessoal. Como é hábito em Portugal. Primeiro, abre-se a porta, beneficiando meia dúzia, para se criar o precedente e, de seguida, se escancarar tudo e toda a maralha entrar (no caso, sair, para o regabofe, evidentemente…).

É, no mínimo, caricato (socialmente criminoso, diria) criar-se o hábito de premiar quem cumpre aquilo a que está obrigado pelo vencimento ou ordenado que lhe é pago. Um tal “prémio” só possível de imaginar-se e de levar à prática em países de opereta, como Portugal tem sido de há cerca de década e meia para cá.

E, como este caso, há centenas similares e toda a gente acha normal. Tão normal, que vamos ver o histerismo que irá rebentar, apenas porque o governo quer regressar à sanidade e seriedade postural de decisores, empregadores e trabalhadores.

Trata-se, este, de mais um caso de evidente “calaceirismo” mesclado de “wiseguyism” e falta de noção de civismo a que assistimos no quotidiano português desde há muitos anos.

O princípio vigente é o de menos trabalho e mais regalias. Trabalhar cansa muito; folgar é que dá pica...

Depois, toda a gente se admira – e até parecem sinceros! – quando nos defrontamos com a situação indignificante a que nos fizeram chegar e também chegámos por responsabilidade inalienável.

Na verdade, como é possível termos chegado ao que chegámos, se somos todos tão bons rapazes, tão cumpridores, tão produtivos, tão, tão, tão, badalão?!...

22 Dez 2011
Ruben Valle Santos

Nota -

Já não recordo bem os anos de idade que era preciso ter para o direito às férias suplementares, mas não andava longe do que aponto. E não recordo bem porque na altura ainda estava ao serviço e marimbei-me sempre para tal idiotice, já que, durante anos e anos a fio, nunca gozei mais do que 20 dias de férias anuais (nos quais estavam incluídos sábados, domingos e feriados) e trabalhava diariamente das 7 às 16,30h, com meia hora de interrupção para almoço.

Durante este período, de cerca de 11 anos, ocasiões houve -- normalmente uma vez por ano -- em que foi preciso trabalhar ao sábado e ao domingo. Inteiros. Nestas circunstâncias foram-me pagas horas extraordinárias.

Noutro período da vida, que durou de 1980 a 1989, por outro lado, trabalhei diariamente até às 19 ou 19,30horas e frequentemente, até bem mais tarde. Foi muito frequente ir jantar às 22/23 horas. Sábados e domingos, nem se contam. E, em todo este tempo, jamais recebi um escudo que fosse de trabalho extraordinário.


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