Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

quinta-feira, 17 de maio de 2012

2949. A hipocrisia galopante

A hipocrisia é uma das mais marcantes características da sociedade portuguesa, melhor dito, de estratos da sociedade portuguesa, sendo o da Oposição e o da maior parte da opinião publicada bem exemplificativos.

Quando se constatou que Portugal não poderia passar sem um pedido de ajuda externa, logo se constatou igualmente que os tempos que estariam para vir seriam duros, muito duros. Havíamos andado a folgar, a rir e a cantar por tempo demasiado e essa postura de irresponsabilidade colectiva iria sair-nos caríssima, como era inevitável que acontecesse.

Quando o pedido de ajuda foi feito e conhecidos os termos do memorando, mais se acentuou a percepção de que o futuro iria ser tudo menos risonho por um período alargado e tanto mais alargado quanto menos decididamente e com custos reais para o conjunto da nação, o problema fosse atacado.

Ora, os custos a suportar – toda a gente com dois dedos de testa o sabia – teriam que fazer-se sentir na diminuição dos rendimentos da população (rendimentos fictícios, como se sabe, por não terem sustentação real no esforço nacional e respectiva produção, pelo que o suporte vinha quase exclusivamente dos impostos que os nossos parceiros europeus pagam).

E a diminuição dos rendimentos gerais teria que resultar – também todos o sabíamos – da abolição de direitos sem suporte e de regalias sem amparo.

A abolição de direitos e de regalias é evidente que teria que visar a diminuição de salários e a perda de emprego para muita gente e bem assim a suspensão de subsídios e outras prebendas similares.

Pretender-se que assim não fosse é ser-se muitas coisas e todas elas pouco dignas, mas, logo em primeira mão, completamente idiota.

Alguém em seu juízo perfeito, de boa fé e consciente das realidades é capaz de vir dizer que, quando lá no respectivo agregado familiar as coisas correm mal sob o ponto de vista económico, a atitude que toma é a de viver como se tivesse ordenado de nababo, em vez de realisticamente apertar o cinto?

Quando no agregado familiar as coisas correm mal, continua-se a pagar à mulher-a-dias ou dispensam-se-lhe os serviços e começa-se a passar a ferro por si mesmo? E, quando se dispensa a mulher-a-dias o dispensante é um patife fascista ou está a zelar pelos interesses do agregado familiar?

Ora, um país mais não é do que um agregado familiar de proporções gigantescas.

Como é que pode alguém bem intencionado pretender que numa situação como aquela em que nos puseram, os níveis salariais se mantivessem intocados e o desemprego ao nível percentual anterior à crise?

Mas isso contradiz tudo o que o senso das realidades determina. Assim sendo, não estaríamos em crise. E estamos assim, precisamente porque alguém nos meteu em crise. E nós ajudámos à festa. Já elegendo-os, mesmo quando vimos que não serviam e que estavam a tramar-nos, já levando vida de ricos, quando não passávamos de pelintras, a viver à custa de terceiros.

Só esta última condição, a de termos vivido tantos anos à custa do esforço e dos impostos alheios, devia ser tal motivo de embaraço para todos nós que uma postura de dignidade obrigar-nos-ia a manter uma atitude de recato e a trabalhar duramente para pagarmos o que devemos e sairmos rapidamente deste lamaçal.

Para nunca mais nele deixarmos que alguém nos metesse.

Pois bem, não é isso a que temos vindo a assistir, o que revela bem a falta de brio e hipocrisia que assola a sociedade portuguesa actual, de que são bem representativas as atitudes dos que isto causaram e agora começam a querer aparecer como se limpos estivessem e os culpados sejam aqueles que estão a esforçar-se por devolver a dignidade ao país e aos seus cidadãos.

Com sacrifícios, sim. Porque sem sacrifício ninguém consegue seja o que for. Porque é o sacrifício que limpa a alma e redime o pecador.

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