Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

910. A Comunicação Social que temos


A Comunicação Social que temos é bem a Comunicação Social que temos. Ponto final. Parágrafo. Requiescat in pace.
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* * *

Podia ficar-me por aqui. No entanto, é bom que continuemos a chamar os bois pelos nomes.

Pois bem:

Dias atrás, em entrevista de corredor, Francisco Pinto Balsemão, referindo-se às estações de TV portuguesas, portanto à dele também, certamente, afirmava mais ou menos isto:


- As nossas TVs estão bem, excepto no que se refere ao noticiário internacional, que dão pouco.


Descontando a afirmação (que seria surpreendente partindo de Francisco Pinto Balsemão, jornalista, mas que já não surpreende tanto, partindo de Francisco Pinto Balsemão, empresário e dono da Sic) de que tudo está bem com as TVs portuguesas, porque, pelo contrário, tudo está mal, com programas de uma pobreza franciscana, sem conteúdo que se veja e de uma assombrosa indigência mental, concordo com Balsemão quando diz que elas, as TVs, dão pouco noticiário sobre o que se passa no mundo.


E vou mais longe. Não dão pouco. Dão... nada. É, na verdade, espantoso como conseguimos ter os maiores noticiários do mundo, em termos de duração, e, ainda assim, não consigamos saber o mínimo dos mínimos do que se passa no planeta.

No tempo da II República, também chamada de Estado Novo, dizia-se que estávamos sós no mundo. E agora, em pleno regime dito democrático?

Se quero saber o que vai lá por fora (na tal aldeia global que o é para todos, menos para as TVs portuguesas), vejo a CNN, a BBC, a TVE ou até mesmo a Al-Jazeera, leio os jornais estrangeiros online ou navego pelos blogs. Através das TVs portuguesas é que não vale a pena. É um verdadeiro deserto. De ideias, de competências, de tudo, afinal.

Imagine-se que dão, como disse atrás, mais de 60 minutos em cada noticiário (da hora do almoço e da hora do jantar) e, desses bem mais do que 60 minutos, a maior parte das vezes não chega a 5 minutos, em cada um, o tempo que é dedicado a notícias vindas do estrangeiro.

Verdadeira mentalidade aldeã (closed mind, sim) tem a nomenklatura portuguesa ao nível televisivo!

E o que é curioso é que, noutros tempos, quando para se ser jornalista nem era preciso ter curso superior, havia mais espírito aberto para o exterior. Hoje em dia é o que se vê. Chauvinismo estúpido. E tanto mais estúpido quanto é certo que assenta em nada. Nada mesmo.

Temos, pois, TVs de índole paroquial. Melhor dito, de nível de comadres. Não têm âmbito mais alargado do que o de qualquer “vila maria”, das que antigamente havia espalhadas pelos bairros de Lisboa, em que as notícias que as pessoas recebiam se limitavam ao recinto onde viviam em comunhão, isoladas do resto da cidade, do próprio bairro.

O que se vê e ouve, pois, nos noticiários televisivos, circunscreve-se a um âmbito territorial contido num diâmetro de umas dezenas de quilómetros. E, mesmo assim, fica-se pelas “comadrices” todas, notícias que a mais ninguém interessam a não ser a, talvez, metade da população do bairro em que se verificam os acontecimentos. E nisto estamos. São raríssimas as notícias que dão, mesmo de âmbito interno, que interessem a mais do que duas dezenas de pessoas.

Àquela surpreendente frase de Balsemão – e surpreendente porque está nas suas mãos “dar a volta ao texto” já que tem o poder e foi precisamente a TV dele que entrou por esse campo, muito embora até já tenha sido ultrapassada – juntou-se ontem uma outra de um amigo meu, setubalense open mind, preocupado com a sua terra, mas não apenas com ela, que se lamentava para mim pelo facto de “os meios-audiovisuais não tirarem partido da nossa história tão rica e bela”. Isto, no seguimento e a propósito de dois posts que publiquei sob o título genérico “Aldeia global portuguesa”, um dedicado à Ilha de Tristan da Cunha e o outro a Punta Arenas.

Não há que estranhar, caro amigo António Alves. As coisas são assim mesmo. A partir do momento em que os jornalistas são licenciados, mas mais ignaros do que antes, tudo é de esperar.

O melhor é enchermo-nos de paciência e - para não estragarmos os nossos dias, assim que começarem os chamados noticiários televisivos portugueses - corrermos a mudar de estação ou irmos para a Net, em busca de noticiários que não agridam qualquer inteligência mediana.


Quanto ao aproveitamento das virtualidades da diáspora portuguesa, não há que esperar seja o que for cá dentro. Tirando os programas de José Hermano Saraiva, cá pelo burgo, que muita gente dita erudita contesta mas que não se vê que algo faça de melhor, nem sequer de parecido, e alguns timoratos e mal amanhados afloramentos, aqui e ali, como foram os do “bloquista” Miguel Portas, aqui há uns anos, a desertificação mantém-se.


No mais? Viver um dia a seguir a outro, esperando que a crise passe…


Por mim, é o que faço. E vou, também, prosseguir com a publicação, tanto quanto possível regular, de episódios da "Aldeia Global Portuguesa".

Se cada qual se dispusesse a fazer o que está ao seu alcance, certamente que nunca teríamos deixado de ser um grande país em que valesse a pena viver. Sem desgosto.

4 comentários:

Agnelo Figueiredo disse...

"E, mesmo assim, fica-se pelas “comadrices” todas..."

É isso mesmo. Ficam-se pelo mais rasteiro, bizarro, voyeur, insólito...
Enfim... pobreza absoluta...

O mais grave é que criaram esta apetência ao "povão". Agora é tarde. Agora, aquela (tv) que arrepiar caminho, por certo soçobrará!

Isabel Filipe disse...

"Se cada qual se dispusesse a fazer o que está ao seu alcance, certamente que nunca teríamos deixado de ser um grande país em que valesse a pena viver. Sem desgosto.
"

Absolutamente de acordo.

Parabéns pelo teu texto. gostei muito

bj

Ruvasa disse...

Viva, Agnelo!

Sim, tornou-se num sem-fim.

É por essas e outras que eui nem culpo muito o tal "povão". Com estes "educadores" e outros que tais, só podia dar no que se vê, não é?

Abraço

Ruben

Ruvasa disse...

Viva, Isabel!

Gostaria bem mais de não o ter escrito, por não ser necessário. Mas a triste vileza prossegue e está pior a cada dia que passa. É impressionante como se pode ser tão tacanho, tão aldeão, tão idiota, tão pouco profissional, sem o mínimo brio.

No entanto, estão sempre a apontar os exemplos que vêm lá de fora.

Como é que eles sabem disso, se não se preocupam em averiguar?

Um facto que vem provar isto mesmo está relacionado com a recente campanha pelo aborto livre. Andou o noss'primêro todo o tempo a dizer aos gritos - como só ele sabe e em initação de outro político de pacotilha - coisas que não correspondem minimamente à verdade, no que se refere às comparações com a Europa e não houve uma estação de TV que mostrasse, com factos e estatísticas, que as tinham, que era falso o que ele dizia.

Comparado com isto, o obscuranbtismo da Idade Média era de meros aprendizes.

Beijinho e obrigado pelo comentário simpático.

Ruben