Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

segunda-feira, 4 de junho de 2007

1109. Novo aeroporto de Lisboa - O voo das aves e os aquíferos


Em vésperas do primeiro encontro promovido pela Assembleia da República sobre a localização do NAL, julgou o Prof. António Brotas, útil divulgar mais alguns dos muitos elementos que tem vindo a trazer à luz do dia, agora os que se relacionam com a “escolha” da OTA, em 1999, reinava António Guterres, os quais ainda hoje são desconhecidos pelo grande público e aparentemente, também, pelo próprio Ministério.

Aqui fica, pois o texto-esclarecimento do ilustre Professor, que já fez parte de elencos governativos socialistas.


O voo das aves e os aquíferos

As estatísticas internacionais indicam que 70% dos choques de aeronaves com aves se verificam numa banda dos zero aos 100 metros acima do solo e que até aos 700 metros há outras três bandas em cada uma das quais se verificam 10% dos choques.

Em 1999, incluído nos EPIAS (estudos preliminares de impacto ambiental) sobre os aeroportos da Ota e do Rio Frio coordenados pelo Professor Fernando Santana, da Universidade Nova de Lisboa, foi apresentado um estudo elaborado por uma equipe de docentes (biólogos) desta Universidade em que, para o aeroporto do Rio Frio (para as duas orientações previstas para as pistas) o risco do choque dos aviões com aves era praticamente nulo na banda dos 0 aos 100 metros, sendo, no entanto, elevadíssimo numa das outras bandas, o que o transformava num aeroporto perigoso quando considerados os choques a todas as altitudes. Uma situação verdadeiramente anómala em termos universais, que ninguém nota quando passa no Rio Frio!

O elevado risco de choques de aeronaves com aves no Rio Frio, conclusão final deste estudo, teve um grande impacto (que ainda perdura na memória colectiva) quando foi referido na intervenção televisiva (em Junho ou Julho de 1999) em que a então ministra do Ambiente, Elisa Ferreira, "chumbou" o Rio Frio por razões ambientais.

Um outro argumento, referido pela ministra nesta intervenção televisiva, mas sem se apoiar em qualquer espécie de estudos, foi o da protecção dos aquíferos subterrâneos no Rio Frio.

Quase imediatamente a seguir, o ministro João Cravinho aprovou a construção do NAL na Ota (sem notar que os argumentos apresentados nos EPIAS contra a Ota eram nuns casos praticamente iguais aos do Rio Frio e noutros, piores ainda).

São estes os factos em que se baseou a escolha do aeroporto da Ota em 1999.

Debrucei-me sobre o estudo do choque das aeronaves com aves no Rio Frio e escrevi uma carta à ministra Elisa Ferreira em que lhe disse que o estudo referido estava radicalmente errado e lhe pedi para nomear dois peritos da sua confiança para analisarem o trabalho inicial e a minha crítica. Enviei uma cópia ao então ministro da ciência, Mariano Gago, que me respondeu dizendo que ele próprio iria analisar o assunto, o que, obviamente, não pode fazer dados os seus afazeres.

O assunto não teve depois sequência, mas a verdade é que, durante perto de 5 anos, o problema da localização do NAL esteve praticamente parado. Por um lado, porque o governo tinha recusado Rio Frio com os argumentos referidos e por outro, porque os inconvenientes e dificuldades da construção de um aeroporto na Ota se foram revelando cada vez maiores.

O único argumento que pode hoje justificar a construção deste aeroporto é a impossibilidade de construir o NAL na Margem Sul. Por isso o ministro Mário Lino se agarra tanto ao risco do choque das aeronaves com aves e ao problema dos aquíferos. (Jamais).

Vou pedir ao Reitor da Universidade Nova de Lisboa para organizar um seminário em que seja possível discutir em termos académicos o problema dos choques dos aviões com aves(1), mas é perfeitamente claro que não é este problema que será impeditivo de construir o NAL na Margem Sul(2).

O problema que exige estudos mais sérios e demorados, e que não foi ainda sequer iniciado, é o da protecção dos aquíferos na Margem Sul e também na Ota. Este estudo deve ser abordado com grande abertura e limpidez para ser convincente. Temos dois anos para o fazer, dado o grande atraso dos estudos sobre a construção do aeroporto da Ota e seus acessos.

Para ele devem ser convidados todos os especialistas portugueses na matéria e, depois, se necessário, especialistas estrangeiros.

Para além da sua importância para definição da localização do NAL, este estudo será importante para sensibilizar o País para a questão da protecção dos aquíferos que é, de facto, uma questão importante para que temos estado pouco atentos.

(1 de Junho de 2007)

António Brotas - Professor catedrático, jubilado, do Instituto Superior Técnico

***
Post Scriptum

(1) - Posso dar aqui uma muito breve indicação de como no trabalho dos EPIAS surge o estranho resultado referido. No texto deste trabalho há erros tipográficos nas fórmulas e alguns enganos nos cálculos, mas a questão de fundo é a seguinte: os autores dizem que o estudo não se aplica às aves migratórias, mas, sobre as outras, a única informação que utilizam é a da existência de terrenos mais ou menos propícios à existência de aves. Atribuem assim aos diferentes terrenos os coeficientes 2, 1 e 0 consoante consideram serem muito, pouco ou nada propícios à existência de aves. Depois, com o auxílio de computadores e a informação sobre as rotas fornecida pela Aeronáutica Civil, estudam as zonas cobertas por um avião com a envergadura de 40 metros ao aterrar e ao descolar, e consideram que a probabilidade de um avião chocar com um pássaro à altitude, por exemplo, de 500 metros, depende do terreno que está a sobrevoar. A hipótese justificava-se se os pássaros voassem exclusivamente na vertical. Como as pistas do aeroporto são de asfalto (coeficiente 0 no que diz respeito à existência de aves) e são longas, um avião ao levantar, no final da pista já vai a mais de 100, razão pela qual a probabilidade de chocar com uma ave na banda dos zero aos 100 metros é nula.

(2) - O estudo anterior parece estar agora ignorado, mas o Ministério insiste num outro sobre os choques com as aves migratórias, tendo recentemente publicado um mapa com um desenho, que parece algo fantasista, dos trajectos que aves migratórias (não se sabe de que espécie nem em que época do ano) utilizarão nos seus deslocamentos entre os estuários do Tejo e Sado. Não se sabe por quem, nem quando, foram feitas as observações (ou os estudos teóricos sobre o voo das aves migratórios!) que permitiram elaborar este desenho, que o Ministério aparentemente pretende utilizar para decidir onde pode ou não pode ser construído o NAL.

6 comentários:

carneiro disse...

Amigo Ruvasa,

Para lá do errático dos políticos, parece ser de concluir que os académicos também não têm ajudado muito.

A única certeza é sobre quem paga.

Mas quem conhece a paisagem do Montejunto, a zona alagada de implantação prevista em Ota e admite como sério o argumento da impossibilidade de expansão da Ota, não fica com muitas dúvidas sobre a errada opção por Ota.

A alternativa é que ainda não me convenceu. Sem que iso signifique a fatalidade de escolher Ota só porque não há alternativas.

Cada vez mais a opção zero, começa a ser a minha. Portela, mais Alverca, mais Montijo.

Até porque o argumento de que todo o tipo de voos tem que estar concentrado no mesmo aeroporto, para que este dê lucro na exploração...

Ruvasa disse...

Viva, Carneiro!

Tudo isso que diz é verdade.

Deixe, no entanto, que lhe refira uma conversa que, juntamente com outras pessoas, tive com um reputado técnico - cujo nome agora não vou referir - aqui há uns tempos atrás acerca desta questão.

O problema da pretendida implantação do NAL na Ota, a todo o custo, é de "razão" ibérica e mesmo iberista e pouco mais, não obstante os interesses económicos particulares também subjacentes...

Não se fala nisso em público por motivos políticos, mas, pelo que me foi dito, esta é que é a verdadeira "fundamentação" da pressa em "atirar" com o aeroporto para o Ota, sem estudos (que não foram completados), sem tento, sem escrúpulos.

Vejamos: qualquer pessoa que pegue num mapa da Península Ibérica, de imediato constata uma evidência clara e insofismável:

Qualquer aeroporto de grande dimensão e com todas as infra-estruturas próprias (que a Ota jamais poderá permitir, pelo terreno em que se quer implantar) para ser erigido em plataforma giratória para voos intercontinentais para África, Américas (Central e do Sul), será um tremendo espinho encravado no coração do aeroporto de Barajas, Madrid. Actualmente, quem, de Portugal, da Extremadura, da Andaluzia, quiser deslocar-se para a América Central e do Sul, tem que ir a Madrid, de onde, finalmente, arranca.

Tome nota dos países envolvidos: Brasil, Argentina, Chile, Venezuela, Guatemala, Bolívia, Perú, Colômbia, México, Cuba, República Dominicana, Jamaica, etc… Faça umas contitas e veja a que conclusão chega. Se se construir outra plataforma giratória intercontinental (que a Ota não permite) em Portugal, qual não poderá ser o rombo em Barajas? É bom que não se esqueça que, excepção feita ao Brasil, os restantes países são de língua oficial espanhola e existem laços importantíssimos com Espanha, principalmente com a Andaluzia, de onde saiu a maior parte da emigração espanhola. Começa-se já a perceber a coisa, não?

Mas essa plataforma mexerá também, pelo menos em parte, com o resto da Europa. E Madrid sofre já a concorrência de Paris e Londres.

Por outro lado, a situar-se na Ota, o aeroporto não só não afectará o trânsito por Barajas, como afectará, sim, e muito, o trânsito pelo aeroporto Sá Carneiro.

Foi-me dito, taxativamente, que a Ota jamais poderá ser transformada em placa giratória intercontinental, por falta de espaço e condições de compactação do terreno pelo que Barajas continuará a ser quem manda.

Com um aeroporto a sul do Tejo, porém, já as coisas mudam de figura.

Não só há a possibilidade de o desenvolver e aumentar sempre que se queira, como se situará na confluência de, como disse atrás, rotas terrestres naturais e muito menos longas do que para Madrid, da Extremadura espanhola e, principalmente, do colosso que é a Andaluzia.

Quando da Expo92, os espanhóis não tiveram dúvidas em gastar uma fortuna no TGV Madrid-Sevilha, não somente por causa da Expo (que duraria 5 meses...), como para dar satisfação a reivindicações antigas da poderosa Andaluzia (aconselho vivamente a conferir no mapa a área territorial abrangida pela Andaluzia e a acrescentar-lhe a Extremadura, para ficar com uma ideia muito nítida).

Ora, depois de tamanho esforço e da implantação que nuestros hermanos estão a ter cada vez mais em Portugal, ainda por cima com um ministro das obras públicas confessadamente em público iberista, com o apoio do noss’primêro, de que estávamos à espera?

Tudo leva a crer que o aeroporto “vai ser implantado na Ota”, por pressão (directiva?) espanhola. Mas, em público, ninguém diz uma palavra sobre este assunto!

Assim estamos em Portugal, no ano da graça de 2007…

Abraço

Ruben

Vou deixar um mapa da Iberia o post seguinte.

Imagens disse...

Gostei da tua fala! Bem explicativa a cerca da problemática que estão a enfrentar aí em Portugal por conta do novo aeroporto! Vistes que também temos problemas? Nossos controladores de vôo estão assoberbados de trabalho, devido ao stress, e também porque existe a área de Brasília com Manaus, onde numa longa faixa não funcionam os radares! Por isso da grande tragédia que sofremos com o legacy americano. Falta competência e responsabilidade nesses casos!



Beijos!!!

Ruvasa disse...

Viva, Leila!

Connosco a competência que falta não é dos técnicos. É dos políticos. Temos um déficit de políticos aceitáveis (não quero dizer bons, apenas aceitáveis) que é impressionante.

São impreparados, incapazes, incompetentes e, como todos os incompetentes, arrogantes e pesporrentes.

Uma desgraça.

Obrigado pelas tuas palavras.

Beijos

Ruben

Ruvasa disse...

Viva meu bom amigo

Tudo me leva a crer que aos socialistas lhes interessa cada vez mais "dominar" o sistema económico e que, cada vez menos, se interessam pela qualidade de vida
dos portugueses.

A curtíssimo prazo os resultados desta política serão lamentáveis e
permanentes, levando a tensões, desgastes e conflitos, que acabarão por destruir o pequeno sistema económico que mantinha algum nível de vida deste BOM POVO.

Um abraço.
AAlves

Ruvasa disse...

Viva, Alves!

Bom povo será... talvez;
Parvo povo é, com toda a certeza.

Engole tudo o que lhe enfiam pelos garganilos e nem tuge nem muge.

Abraço

Ruben