Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

quarta-feira, 10 de junho de 2009

2296. João Costa Figueira - In memoriam

Nascido a 17 de Dezembro de 1915, no Lavradio, o ilustre cidadão que foi o Dr. João Costa Figueira, faleceu, em 30 de Maio último, em Famalicão, com 93 anos de idade.

Aluno premiado do seu curso superior de Economia (1942-1946), em Ciências Económicas e Financeiras, foi autor de vasta bibliografia, respeitando grande diversidade de temas, com ênfase especial os de índole económica.

Nessa qualidade, são de sua autoria cerca de 4.000 páginas de texto impresso em formato comum.

O seu nome figura, desde 1959, com respectiva notícia, na Enciclopédia Portuguesa e Brasileira (e nos apêndices de 1983 e 1998).

Para além de uma actividade literária e científica multifacetada, como escritor e conferencista, foi director da página económica do semanário O país, tendo visto um dos trabalhos de sua autoria, sobre política brasileira, por altura das presidenciais de 1985, sido mandado transcrever em Acta da Câmara Federal de Brasília.

Foi fundador, editor e director-adjunto de semanário político A Nação, director do jornal Notícias do Comércio e presidente do Círculo de Cultura Luso-Brasileiro.

Conheci o Dr. João Costa Figueira, em 1991, através de duas pessoas que fazem o favor de ser minhas amigas. Uma filha, Dra. Maria de Fátima Costa Figueira Abrantes Mendes, com quem tive o prazer de trabalhar na Comissão Nacional de Eleições, e o genro, juiz-desembargador Dr. Sérgio Abrantes Mendes, que me convidou a com ele colaborar no Ministério da Justiça, quando da sua comissão de serviço como Director Geral dos então Serviços Judiciários, hoje Administração da Justiça.

Desde sempre muito me impressionou a vitalidade de Costa Figueira. De figura franzina e atacado por doença crónica não grave nem incapacitante, mas debilitante e que o obrigava a ter cuidados especiais e muito atentos com a alimentação e estilo de vida, tal circunstância, que noutra pessoa sem a sua energia interior teria sido motivo de incapacidade, não chegou para o impedir de, até ao fim da vida, se conduzir com surpreendente desenvoltura e rara lucidez de espírito.

Embora, como disse, tenhamos sido apresentados em 1991, apenas em 1999 iniciámos contactos pessoais, que se prolongaram mais assiduamente até Outubro de 2004, a partir de quando tais contactos passaram a ser mais esporádicos e por via telefónica.

Foi, pois, no decurso desse período de cinco anos que tive oportunidade de melhor o conhecer e de me surpreender com a sua capacidade, conhecimentos, enorme cultura e perseverança sem limites, embora queixoso dos entraves que a doença sempre lhe ia colocando no caminho, pois foi-me dada a oportunidade, que constituiu prazer inesperado, de lhe prestar colaboração na revisão e restantes trabalhos de preparação da edição de três livros.

Isto, note-se, num homem que, em 2000, altura em que publicou Ao quinto dia em Paris, romance-crónica dos anos 50 em Portugal, obra de grande fôlego, de 620 páginas, estava já à beira dos 85 anos de idade!

Pois bem, não saciada com tal façanha a sua enorme sede de realização intelectual, Costa Figueira publicou ainda mais dois livros. Outro romance, Carolina Amélia (310 p.), um caso de amor, em 2003, e, finalmente, em Outubro de 2004, a dois meses de completar 89 anos, A Política, essa grande porca..., (320 p.), de intervenção e denúncia política, obra que, alicerçada em documentos transcritos, se mostrava muito incomodativa para algumas figuras gradas - e de estatura não tão notável como se atribuem... - da cena política portuguesa, no actual regime.

Esses cinco anos de contactos regulares foram para mim uma excelente oportunidade para troca de ideias e, acima de tudo, para ouvir na voz de um cidadão de enorme capacidade e experiência, relatos de história social e política - portuguesa mas não somente portuguesa - bem como uma surpreendente expressão de esperança, num homem de 90 anos, num futuro melhor para Portugal e para os Portugueses.

João Costa Figueira deixou-nos fisicamente no final do mês passado. E deixou-nos com uma sensação de que algo se perdeu definitivamente, por irrepetível . Pessoalmente, legou-me, porém, a recordação de momentos muito agradáveis e que me têm sido muito úteis. Porque, por mais que aprendamos, nunca aprendemos tudo. João Costa Figueira, contudo, esteve perto dessa meta inatingível. Muito perto mesmo.

Tive oportunidade de, quando do acompanhamento dos últimos momentos entre nós, estar presente e solidarizar-me com a dor da família. Não quero, porém, deixar passar este momento sem reiterar o que então pude transmitir pessoalmente.

João Costa Figueira foi um Português que jamais envergonhou Portugal; muito pelo contrário, dignificou-o. O melhor que pôde e soube. Até ao fim. Que mais se lhe poderia pedir?

Requiescat in pace!
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