Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

sábado, 8 de setembro de 2012

2972. Factura cá, factura lá...

N o programa que acabo de rever, “Negócios da Semana”, de José Gomes Ferreira, na SIC Notícias, com a intervenção de Domingos Azevedo, bastonário da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, ambos se declararam muito favoravelmente impressionados com uma solução, dita quase milagrosa, da Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais.
E qual é essa medida? A de os cidadãos pagantes de serviços poderem, a partir do momento em que a medida esteja em vigor, deduzir as despesas que façam com o pagamento de tais serviços na declaração de IRS.

E ainda mais milagrosa porque os cidadãos nem sequer terão de levar essa despesa à declaração de IRS, porque ela lá estaria automaticamente, em fase mais adiantada do desenvolvimento da medida.

Não sou fiscalista, não sou economista, não sou mais do que um simples cidadão pagante, muitas vezes não bufante mas já em algumas barafustante mesmo. No entanto, não vejo na medida assim tantos méritos. Com toda a franqueza!

Acredito na boa vontade e ciência do que está a fazer, por parte do secretário de estado e respectiva equipa, mas fico meio sem graça quando constato que se opta por soluções que ainda têm tudo para não resultarem em cheio, porque repletas de buracos por onde se pisgam das obrigações fiscais todos os malandrins que por aí se passeiam.

Argumenta-se que tal medida tem a virtude de poder subtrair à fuga aos impostos muitos serviços que hoje fogem, o que será um resultado excepcionalmente bom.

Perante isto, fico a pensar:

- Mas por que carga de água esta gente se contenta com o bom, quando pode ter o óptimo e com menores trabalhos e sem dependência da boa vontade do cidadão pagante, boa vontade essa sempre muito falível?

Explico a razão da minha estupefacção:

É certo que, com a medida agora anunciada, muitos trânsfugas serão caçados e boas receitas virão ao Estado, o que não acontece agora.

No entanto, para além de ainda muitas situações não serem abrangidas, como é caso mais flagrante o da construção civil, é evidente que, mesmo nas situações que é suposto estarem contempladas, haverá sempre a possibilidade de fuga.

E haverá sempre fuga porque a coisa assenta muito na necessidade de eu, pagante, exigir emissão de factura.

Explico mais detalhadamente, para não restarem dúvidas a ninguém. Nas redes é mesmo necessário que ninguém fique com dúvidas, porque aparece sempre alguém que percebe tudo ao contrário, por mais bem explicadinho que esteja:

Imaginemos que tenho, há muitos anos, todos os serviços de mecânica automóvel executados em determinada oficina. De tal modo que existe já uma certa cumplicidade entre nós. Nem eles nem eu temos alguma vontade de ver facturas emitidas. E ambos por razões tão evidentes que nem perco tempo a explicá-las. Que me desculpem os tais que nada percebem a não ser com desenho… colorido.

Como é que, com esta medida, deixará de haver figa ao fisco? Haja alguém da secretaria de estado que me explique, que eu não vejo.

Começa logo porque é do nosso interesse mútuo – meu e do meu “amigo” mecânico – continuar sem facturas metidas no negócio. Depois, porque, mesmo passando eu, de repente e por artes mágicas, a ser um cidadão muito consciencioso para com o Estado e pouco para comigo próprio, jamais me passará pela cabeça exigir qualquer tipo de factura ao meu “amigo” que me desempana o carro e me tem desenrascado muitas vezes, com arranjos imediatos, porque não posso ficar nem um dia sem a “máquina”.

Há já, de há anos para cá, uma certa cumplicidade entre nós e não será o charme do secretário de estado que a desfará com um simples aceno da varinha de condão.

Portanto e até para não começar a notar que o meu carro já não é arranjado como era habitual, coíbo-me de fazer exigências ao mecânico e, porque também não me convém, penso cá para comigo que o que gostaria é que o secretário de estado vá dar uma volta ao bilhar grande que eu continuo “abraçado” ao mecânico “fujão”, numa amizade quase familiar.

Aquilo tem sido – e, pelos vistos, vai continuar a ser – uma transacção bolso-a-bolso, sem máquinas “abusadoras” de permeio.

Não vejo, pois, na medida anunciada, as grandes virtualidades que Domingos Azevedo e José Gomes Ferreira vêem. Admito, porém, que o defeito seja meu, até porque sou “caixa de óculos”.

* * *

A “minha” solução seria outra e, quanto a mim, bem mais simples, curta e grossa. Sei que se trata de uma solução muito “despida”, à qual faltarão os “indispensáveis” requisitos de complexidade e confusão, para dar trabalho mental de alta transpiração e largo proveito a muita gente, mas acredito que seria a solução radical para acabar com a fuga ao fisco.

Aí vai ela em 17 palavrinhas apenas, que são muitas mais do que as letrinhas da palavra “mãe”, mas têm igualmente muitas virtualidades:

Quem tem negócio de porta aberta fica obrigado a dispor de máquina registadora, devidamente selada e controlada”.

– Mas… – contrapor-me-ão alguns desmacha-prazeres – … e então como é que isso é controlado? Não vai ficar tudo na mesma?

Quero lá saber de como isso é controlado. A autoridade fiscal que pense nisso, que eu já fiz a minha parte. Mas… não me importo de deixar uma dica:

Não está a ser engrossado o quadro dos inspectores fiscais? Então, que não haja acanhamentos. Mande-se-os para o “terreno”… fazer o seu trabalho ou seja, fiscalizar. De S-U-R-P-R-E-S-A , hã?!

E não digo que, atrás desses se mandem outros para os fiscalizarem a eles, porque, enfim… Mas…

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