A minha tradutora Zhang Yin passa lá (nos armazéns Ikea de Pequim) todos os fins de semana, com o marido, para decorarem a nova casa. A agente mobiliária Liliana Xu compra lá tudo, até mesmo as toalhas das mãos. Zhimin Ma, funcionária duma multinacional farmacêutica, gastou num armário o equivalente ao que o pai ganha em dois meses. É a geração Ikea de Pequim. Os membros da classe média (nota: mais de 200 milhões – Os USA têm 260 milhões de habitantes...), na faixa dos 30 anos de idade, decoram as respectivas casas apenas ao estilo informal mas sofisticado sueco, de design jovem, madeiras claras e linhas ultramodernas.
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Dado o sucesso, os suecos inauguraram um segundo hipermercado do móvel na capital e possuem outros quatro em Xangai, Shenzhen, Guangzhou (Cantão) e mais dez em construção por toda a China.
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A geração dos pais e das mães que viveram a revolução cultural dos anos 70 – os estudos interrompidos, o trabalho nos campos – ou as esperanças políticas dos anos 80 desfeitas na Praça Tian’anmem consola-se hoje em dia com a prosperidade destes filhos. Zhimin, com duas licenciaturas e fluência em três línguas, trabalha na empresa farmacêutica italiana Bracco e aufere um salário oito vezes superior ao do pai (nota: professor de liceu, residente a 4 horas de Pequim e com um salário mensal de 150€): é o bilhete de entrada no novo mundo do Ikea, das idas às compras aos supermercados Carrefour, Matro, Wal-Mart; dos restaurantes de comida rápida Pizza Hut, KFC, dos cafés Starbucks, dos automóveis Volkswagen (nota: o modelo mais baixo é o Passat) e Buick.
Todavia, mesmo em Pequim, este novo mundo não se encontra ao alcance de todos. O rendimento médio na capital, revelam as estatísticas oficiais, é de precisamente 2500 iuanes (250€) por mês.
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Mas a média estatístuica não passa de uma abstracção, num país que, numa questão de meia dúzia de anos abriu no seu interior desigualdades mais profundas que as existentes na Índia.
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Cabe agora aqui referir que, paredes meias com este trem de vida há em Pequim outro. Aquele que se serve do célebre comércio tipicamente chinês, aos preços chineses habituais. Mesmo o próprio Ikea criou uma secção de objectos ao preço único de 1€, para aqueles que não dispõem do poder de compra acima descrito. Também eles são contemplados e neles se está a incutir o espírito consumista, com vista ao futuro.
Onde antes existia apenas uma classe, a dos chineses comuns, todos por igual, de onde apenas se destacavam os dirigentes políticos, notam-se, agora claramente, três estratos sociais, a saber:
* as grandes fortunas, os multimilionários;
* a classe média – a tal que não existia e tem agora salários da ordem dos 250€ mensais;
* os chineses tradicionais, com os rendimentos abaixo deste nível.
O que não se encontra, nem na China do Norte (Pequim, Xi’an), nem na do Centro (Shanghai), nem na do Sul (Guilin) – é qualquer sinal de miséria como se topa por todo o lado na Índia, no Nepal, no México…
E não se encontra igualmente, o mínimo sinal de restrição de acesso seja a que local for. Impressionante!
Voltarei.…