Os portugueses têm de salvar-se de si próprios, para salvarem Portugal

sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

800. Vêm aí os chineses… (1)

Reflectindo, ainda que insuficientemente, toda a estupefacção e todo agrado que em mim causou recente visita à China, onde qualquer pessoa pode constatar, certamente com enorme surpresa, mas igualmente com um imenso fascínio não antecipado, regresso hoje a temas chineses, através da transcrição de extractos da introdução ao livro Il Secolo Cinese (O Século Chinês), de Federico Rampini, jornalista italiano, correspondente em Beijing do jornal La Repubblica.

Vejamos, pois:

(…)
A ignorância que a maior parte dos ocidentais revela a respeito da China tem uma atenuante: fomos apanhados de surpresa. Tudo se passou a uma velocidade alucinante. Ainda há 20 anos, Xangai era uma cidade decrépita e estagnada o aspecto dos seus edifícios poucas alterações sofrera desde a Segunda Guerra Mundial, as ruas apinhadas de bicicletas e riquexós a motor ofereciam uma paisagem de Terceiro Mundo, e fazer compras em qualquer grande armazém era uma experiência frustrante, dada a escassez de produtos e a indiferença das empregadas. Bastou fazer saltar a “rolha” do maoísmo, que contivera infinitas energias ocultas, para permitir que o milagre acontecesse. A disciplina e a obediência dum povo para quem o trabalho continua a ser uma bênção; o lendário talento comercial que o comunismo não conseguira suprimir e que permanecia bem visível na diáspora de Hong Kong e Macau, Taiwan e Singapura, São Francisco e Carpi; a parcimónia das famílias e os inesgotáveis fundos de poupança; o respeito confuciano pela instrução: tudo isto permitiu a ocorrência do milagre chinês, aquele “grande salto em frente” que Mao Tsé-Tung não conseguira dar. Hoje Xangai possui um comboio de alta velocidade a que nem a Itália se pode dar ao luxo; o ritmo de construção de novos arranha-céus é tal que, quem se ausentar por seis meses, quando regressa fica desorientado e aturdido com as mudanças. Por entre a explosão deslumbrante das vitrinas, o consumidor é senhor absoluto e desfruta de uma qualidade de serviço sem comparação no Ocidente. A atmosfera vibra de entusiasmo. A China tem consciência de que se encontra no centro do mundo, mostra-se confiante no futuro, e quem lá vive não tarda a deixar-se contagiar pelo seu optimismo tenaz.

Vimo-nos forçados a habituar-nos aos milagres asiáticos: o do Japão, a Coreia do Sul, Hong Kong e Singapura são países que demonstram que sabem queimar as etapas do desenvolvimento. A China, porém, constitui um caso particular e de dimensões tais que a sua descolagem gera choques sem precedentes. Estamos a assistir a um daqueles movimentos sísmicos que alteram o curso da história humana. À medida que se transformar a si própria a uma velocidade inaudita, a China transforma inevitavelmente todo o planeta. Nunca, no mundo contemporâneo, um país emergente deteve semelhante poder para perturbar as relações das forças económicas e os equilíbrios diplomáticos e militares. Nunca se vira nascer do nada, em escassos vinte anos, uma nova classe média urbana de 200 milhões de pessoas dotadas dum poder de compra “ocidental”. A China é a única potência que desafia a influência dos Estados Unidos, e não apenas na Ásia, mas também na América Latina e na África. (Está a começar a fazê-lo também na própria Europa, como bem sabemos…, nota minha). É o país que, tendo acumulado 600 mil milhões de dólares de reservas monetárias, exercita um poder crucial sobre o mundo financeiro de Washington. Os norte-americanos foram os primeiros a compreendê-lo.
(…)

O texto é bem elucidativo do que aí vem. Permiti-me colocar em bold algumas passagens, por as entender de importância vital para o desenvolvimento de qualquer sociedade humana e bem assim, ilustrativos da dimensão e velocidade da transformação que está a ser operada.

Por hoje, ficamos por aqui.

O tema é, porém, inesgotável, pelo que a ele voltarei.

7 comentários:

Anónimo disse...

A China vai-se tornar em 2020 uma mega potencia naqual vai rivalizar com os EUA, mas a China tem bastante problemas que sao desconhecidos ou ignorados pelos os ocidentais, e' um pais com 1.5 bilioes de habitantes, a grande maioria vive na probreza total e so' mesmo a chamada disciplina oriental consegue fazer com que eles trabalhem em situacoes de escravatura, e depois temos que ver que para a China se tornar numa potencia economica vai ter que abrir mais cedo ou mais tarde as fronteiras `a liberdade de expressao e ai vai começar o problem, ou seja a China vai ter a tendencia a se dividir ja' que tem povos que se odeiam como os chineses do norte que odeiam os chineses do sul, Tibete, povos que fazem fronteira com o Afeganistao e India, etc.
O maior problema que a China vai enfrentar vai ser o problema da energia e as mudanças climaterias, no primeiro caso e' o ouro negro que ja' começa a faltar e no segundo caso esta' na poluiçao naqual todos nos somos testemunhas na mudança climateria com as temperaturas a aumentar e os gelos dos polos e Gronelandia a derreter naqual vai provocar em poucos anos mais desastres ecologicos e o aumento do nivel das aguas que vao simplesmente mudar os mapas do mundo, se a Katrina foi um exemplo naqual milhares de pessoas ficaram sem casas agora imaginem a tragedia que se vai dar na China e na India com centenas de milhoes de pessoas a terem que evacuar.

Ruvasa disse...

Hello, Slanwar!

Abraço para ti.

O que dizes não deixa de ser verdade, realmente.

Mas o que por lá já se vê, actualmentem que corresponde ao que o jornalista refere (e verás que ele vai aludir a mais condições) é absolutamente assombroso.

Confesso-te que fiquei completamente estarrecido com tudo quanto vi. Com o modo extremamente afável com que fomos recebidos em todo o lado, no à-vontade com que nos deixam andar por onde queremos e fotografar tudo o que queremos (com excepção do Buda de Jade, por razões de preservação), a afabilidade do povo, tanto nas cidades como no campo, tanto a Norte como a Sul.

Não me importo nada de me confessar totalmente rendido. E a classe média chinesa (os tais 200 e tal milhões) vive mesmo bem. Certamente que haverá muitos mais que vivem bem pior, mas o que é certo é que, tendo andado por onde, de Norte a Sul andámos, não vimos miséria, não vimos exclusões sociais. E ninguém nos impediu de ir fosse onde fosse.

Vim de lá de tal modo impressionado, que o referi várias vezes. No Natal, ofereceram-me o livro que tenho vindo a reportar e que me acontece? Simplesmente que o jornalista italiano, que vive lá há bons anos, põe em livro exactamente aquilo que eu fiquei a pensar, pelo que vi, corroborando as minhas impressões.

Na verdade, para mim os chineses vêm mesmo aí. Serão o próximo império. O dos mil anos? Sabe-se lá! Mas, aconteça o que acontecer, eles vêm aí. Aliás, já cá andam.

Como vos é mais fácil ir até lá do que a nós, vai mesmo lá. Ficarás impressionadíssimo com Beijing, com a modernidade da cidade, que daqui por uns 20 a 25 anos, baterá Nova York em qualidade de vida e em riqueza.

Abraço grande e continua a mergulhar, ok?

Estás a viver onde, agora? Da última vez era na Flórida, não?

E o curso? Já acabaste?

Ruben

Anónimo disse...

Ruben,
está a dar na tv-2
um documentário sobre a China actual :-)

Beijinho

zé lérias (?) disse...

Também não tenho dúvida de que a China, para nossa felicidade, vai dentro em pouco retirar aos states o seu poderio arrogante e ganancioso.
Esperemos que as suas políticas sejam de molde a tornar exequíveis as boas relações entre os povos. Bom fim de semana.

Ruvasa disse...

Viva, Maria João!

Infelizmente, não vi a tempo o teu post, pelo que não assisti ao programa. Mas a Odisseia, o Travel (com os Globetrekers e o Thirsty Traveller), o People & Arts e outros, passam constantemente programas sobre a China.

Nunca serão demais, para percebermos o fenómeno e, mais ainda, a filosofia que subjaz à sua maneira de viver e de encarar o semelhante.

Há uma coisa em todo o processo que não me deixa muito descansado: são muito afáveis, extremamente trabalhadores e prestativos, mas a vida humana não tem para eles o valor que tem para alguns de nós (e digo apenas alguns de nós porque nem todos temos o mesmo respeito pela vida humana, como é sabido). Ora, isso, deixa-me apreensivo.

Beijinho

Ruben

Ruvasa disse...

Viva, Zé Lérias!


Espero o mesmo, apenas com o senão, que é um grande senão, como é sabido, que apontei na resposta que dei à Sulista, imediatamente antes desta. O caso do valor que é atribuído à vida humana, que do meu ponto de vista deve ser preservada a todo o custo e com eles esse apego não se vê tão claramente.

Abraço

Ruben

Ruvasa disse...

Viva, Luís!

O teu patrão deve estar a exagerar. Provavelmente é de Taiwan ou, então, não vai à China há já mais de 5 anos.

Andámos por todo o lado que quisemos, fotografámos tudo o que queríamos fotografar, entrámos onde nos deu na real gana e ninguém nos impediu. Ao todo - em 15 dias de estada lá - fardados devemos ter visto para aí uns 50 polícias.

Experimenta o livro de que tenho vindo a falar, Il Secolo Cinese, do Federico Rampini. (Como não sei se está publicado aí - deve estar - envio-te o url da editorial Presença, que o distribui cá: www.presenca.pt.

Mais: o ano passado estivemos no Tibete que, como sabes, está ocupado pelos chineses desde 1959.

Então, no Tibete, fizemos a viagem da fronteira com o Nepal até Lhasa, de jeep (são mais de mil quilómetros) passámos por todo o planalto tibetano, estivemos nas cidades de Zangmhu (fronteira com o Nepal), Shigatse, Gyantse e Lhasa. E aldeias como Shegar e Latze. Mais uma vez falámos com quem quisemos, fotografámos tudo, fomos onde quisemos e não vimos qualquer miséria.

Não há por lá nada que se pareça com a desgraça da Índia ou do Nepal ou mesmo de tantos outros sítios que a gente vê nas TVs ou via cá em Portugal ainda há 20 anos...

E... como bem sabes, de comunista não tenho nada. Não confies muito no teu patrão. Vai lá e logo verás.

Força nesse curso. hei-de ir lá ver o forno.

Pois, eu sei que vives em New Jersey. Enganei-me, por aqui h´+a tempos teres dito que ias à Florida fazer não sei o quê. A propósito: tens visto o Tony Soprano? ;-)

Abraço grande.

Ruben