A minha amiga Sulista tem razão quando, no seu blog afirma que o povo é soberano e que a maioria não quis assumir a responsabilidade pela liberalização do aborto.
Na verdade, na sua esmagadora maioria 56,5%* do universo eleitoral (os abstencionistas) mais a percentagem de 41%* dos votantes no Não dá um número elevadíssimo de quem não quis ligar o seu nome a uma tal ignomínia.
Não obstante isso, estou com Matilde Sousa Franco que, na Sic, acaba de dizer que está triste porque, este resultado significa um recuo civilizacional do nosso país.
Efectivamente, assiste toda a razão a Matilde Sousa Franco, porque o que vai ficar para a História é que Portugal e os Portugueses entraram hoje no combóio da regressão civilizacional. E, em termos de direitos, liberdades e garantias individuais, precisamente relativamente ao direito individual mais importante - e que por isso mesmo deveria ser o mais acarinhado - de quantos o ser humano pode reclamar para si, ou seja o direito de nascer, o direito de ter uma vida, assim acontece.
Trata-se da página mais negra da nossa História comum, em termos civilizacionais. Nós, que fomos pioneiros na abolição da pena de morte!
O estar individualmente liberto desse labéu - porque não foi essa a minha opção e contra ela combati - não me deixa mais sossegado do que nesse mesmo âmbito, o individual. Mas eu não sou um indivíduo isolado. Vivo numa comunidade e, no que que concerne à minha integração nessa comunidade que é o povo português que se diz - e tem sido até hoje - humanista, sinto-me mortalmente atingido.
Não importa o que o ministro da justiça, uma vez mais alegre e alvarmente faltando à verdade e sabendo que o faz, declarou, também, há pouco, na RTP, ou seja, que estamos no combóio da civilização, tal como a grande maioria dos países mais avançados do mundo, o que é redondamente falso e ele sabe que o é - para confirmar, basta ir confrontar os dados oficiais e sérios de cerca de 200 países que circulam aí pela Web, por exemplo, aqui, no blog do meu amigo Azurara, que linka para os dados oficiais da ONU.
O que importa, isso sim, é a realidade. E a realidade é que hoje uma parcela do povo português, que não foi integralmente maioritária, mas que é formalmente democrática - embora aqui a democracia formal não esteja necessariamente umbilicada com a razão, como não está - optou por dar força a quem já era o mais forte, a mulher grávida, ao mesmo tempo que a tirava a quem já pouca a tinha e agora menos ainda terá, ou seja, o filho que aquela traz no ventre. Ele tem consigo a Razão, mas de que lhe serve se lhe extorquiram a Força?
Este 11 de Fevereiro de 2007 é, pois, um dia para não mais esquecer. O dia mais triste e mais negro que Portugal já teve, que os Portugueses já sofreram e que a sua História de país quase milenar e até aqui sempre humanista já registou.
Haverá muita gente que disso não se aperceberá agora e será mesmo levada a entender que o que me faz escrever estas linhas é um sentimento de frustração pela derrota.
Entender nesses termos, porém, é lavrar em erro grosseiro. Como já tive oportunidade de dizer, este assunto nada tem que vem com meros perdas e ganhos eleitorais, porque não se trata de uma questão comum, de lana caprina, como tantas vezes é a eleição de um governo, por exemplo.
Este assunto é - apenas e só - a equação mais difícil e importante que ao ser humano algum dia pôde se apresentado, para que resolvesse. Trata-se da sua própria dignidade enquanto ser humano e do reconhecimento ou, pelo contrário, da negação da vida a seres que a si são semelhantes, portanto com iguais direitos, que não lhes podem ser negados.
Por isso estou triste, imensamente triste. Triste por mim, triste por Portugal, triste, muito triste pelos Portugueses. Jamais me passou pela mente admitir que um dia em Portugal, este povo, uma parcela dele, ainda que conjunturalmente, se colocasse numa situação tão pouco humanista e, até mesmo, humanitária.
Quem não perceber isto agora, que deixe passar algum tempo e talvez o venha a entender mais depressa do que imagina. De qualquer modo, será tarde. É a história da pedra que alguém atira. Uma vez lançada, é facto irremediável.
A minha tristeza é profunda, muito profunda, creiam. E a vergonha não é menor.
...
* Números provisórios, uma vez que estou a escrever antes do encerramento do escrutínio
...
7 comentários:
Caro Ruvasa,
Sem querer entrar em discussão com o essencial deste texto até porque acredito que essa tristeza seja sentida há um reparo que não posso deixar de fazer.
Quem não vota entrega a decisão a quem vota. É tão simples como isso. Se 56,5%, como afirmas, não quer ligar o seu nome a "uma tal ignomínia" também 56,5% não quis ligar o seu nome a um categórico não a "uma tal ignomínia". Fazendo as contas doutra forma, ou seja, de todos os que podiam votar apenas 17% foram votar e disseram "Não" e apenas 27% disseram "Sim", sendo que 56% não se importaram em votar nem "Não" nem "Sim", ou seja, entregaram a decisão.
Diria que a lógica usada no texto dá nos dois sentidos.
Abraço,
Viva, Ricardo!
Eu não joguei com lógica, nem dela cuido de saber.
Há casos, meu amigo, em que a lógica é uma batata podre.
Para além disso, há casos em que chamar a lógica, não faz sentido, redundando numa total destituição de outras coisas bem mais importantes.
A lógica é usada para dirimir questões de pensamento asséptico por insensível.
Não é este o caso. Este é um caso de sentimentos, de Ética e de Moral. Não se compadece com argumentos de lógica.
Há quem o compreenda e há quem o não compreenda. Os meus votos vão todos no sentido de que, tão breve quanto possível, todos o compreendam. Teremnos, então, sim, uma sociedade justa e democrática em toda a acepção da palavra. (Isto, muito embora, como disse, a pedra já tenha sido lançada e, por isso, o acto e seus efeitos nâo possam ser retirados e escondidos já).
Enquanto tal não acontecer, mantenho na íntegra o que escrevi. E afirmo que apenas por uma questão de moderação - mas também de perda de ânimo -, não escrevi mais.
Este assunto, Ricardo, nada tem que ver com uma eleição ganha ou perdida por um partido. Este assunto é coisa séria. A eleição de um partido em Portugal, já não o é há muito tempo. Mas este assunto, era. Talvez o último.
Perdeu a seriedade agora também.
E por aqui me fico, encerrando a questão, pela minha parte.
Abraço
Ruben
Abraço, caro amigo. Compreendo perfeitamente o teu estado de alma.
Infelizmente este resultado mostra como uma minoria de 27% se acha legitimada para, valendo-se da falta de informação séria sobre um assunto (que motivou a abstenção), legislar sobre a morte.
Não fiquei surpreso. Estarei, isso sim, revoltado.
Viva, Henrique!
Se fosse o legislar sobre a morte, não estaria preocupado. Que se entretivessem lá com esses assuntos macabros, que, aliás, lhes assentariam como luvas.
O pior é que legislarão acerca de quem decidirá, atrabiliariamente - e, em grandíssima parte dos casos, sem a minima noção de quais os valores envolvidos - sobre a vida ou a morte de inocentes indefesos.
É a solução, afinal? Será que é mesmo?
Abraço
Ruben
Meus amigos. Pois eu sem problema digo que não fui votar. Como quem me conhece sabe, sou partidário do Não. A decisão de não votar foi de última hora e perfeitamente consciente. Querem saber? Sinceramente… fartei-me. Fartei-me desta treta de país com uma gente da treta. Cambada de energúmenos incultos e terceiro mundistas, com uma comunicação social facciosa e parcial que com o seu grande poder orienta o país a seu bel-prazer. Com uma classe política incompetente e corrupta, que de valores só conhece os que se encontram nas faces das notas de euro. E com um povo que merece tudo o que lhe acontece e pior. Já tinham a ideia fisgada na cabeça e nem que lhe mostrassem todas as razões, as orelhas já estavam mocas e os olhos vidrados.
Quero lá saber… forniquem como Leões, rebentem com os colchões, os sofás, as banheiras, os bancos traseiros das carrinhas. Fornique o Avô, a avó, o papá a mamã, o filho a filha o neto a neta e os primos dos 8 aos 88 todos juntos de preferência. Pobres, ricos, no meio, por cima, por baixo, aos grupos e magotes. E melhor de tudo, sem protecção, dá mais gozo e prazer e o engravidar já não assusta ninguém. Era só um bicho papão que algumas mentes antigas usavam para assustar as moças e moços da escola secundária. Já andavam todas aos saltos com hormonas que há muito ninguém neste país sabe educar. Agora com a perspectiva de o aborto passar a ser à borla e secreto, já ninguém os pára. Nem me vou admirar quando o Sócrates (gajo que aparentemente pega de empurrão e que nesse caso nunca teve problemas de engravidar nenhuma mulher) em vez de ajudar ainda se lembrará de subir o imposto aos preservativos e criar a TSA taxa suplementar do aborto – pois que alguém (todos os contribuintes) vai ter de pagar todas estas operações, e olhem que vão ser muitas. Além disso ainda vai nascer outro imposto. O do auxilio aos seropositivos. Coitados dos gajos da Abraço nem vão dar conta do serviço que vão ter.
Sim porque este é um país de aparências. – Porque é tão lindinho que não pode ter sida nem outras doenças. - Antes ainda punham camisinha por causa de uma possível gravidez agora já não vale a pena. Muitas dores de cabeça vão ter os pais.
HaHaHa – Mas alguém acreditou que alguma abortante ilegal foi para a cadeia? Hahaha – Mas há algum tribunal em Portugal que funcione? No mínimo levava 20 anos a condenar, isso se não prescrever. E acreditam mesmo que os abortos ilegais acabam.
LOL muitos abortos ilegais continuarão por causa da vergonha. Uma adolescente ou mulher jovem não há de querer ir a um hospital mesmo com segredo médico. Ora se o segredo de justiça é o das forças policiais e é o que é, imagine-se o de um hospital em que entram milhares de pessoas. – Bom dia D. Maria vem das limpezas no hospital? – Sim, sim D. Ana e olhe, sabe quem vi lá hoje na fila para abortar? A sua menina, a mais novinha, a de 14 anitos, tá tão crescida veja bem, parabéns….
Não votei, já não quero saber, o que me importa é a minha família, o resto que vá para o inferno se isso merecer (e quem mata sempre ouvi dizer vai…). A minha mulher é diferente da maioria neste país. Ficou grávida logo ao primeiro dia e teve 9meses de gestação, agora há aí uma subespécie humana que só engravida às 12 semanas.
É uma sociedade de conveniências, mudam-se regras, valores, leis, morais, consciências e visões, para facilitar a sem vergonhice, nem a vida é sagrada. Não queríamos Liberdade no 25 de Abril, o que este povo queria é Libertinagem. Pois é, vai conseguindo. Olha e nem digo mais nada que cada vez fico mais triste de viver numa terra destas.
Enviar um comentário